terça-feira, 1 de maio de 2012

Fragmento de "A vaca e o hipogrifo - Mário Quintana


“Sempre desconfiei de narrativas de sonhos. Se já nos é difícil recordar o que vimos despertos e de olhos bem abertos, imagine-se o que não será das coisas que vimos dormindo e de olhos fechados... Com esse pouco que nos resta, fazemos reconstituições suspeitamente lógicas e pomos enredo, sem querer, nas ocasionais variações de um calidoscópio. Me lembro de que, quando menino, minha gente acusava-me de inventar os sonhos. O que me deixava indignado.
Hoje creio que ambas as partes tínhamos razão.
Por outro lado, o que mais espantoso há nos sonhos é que não nos espantamos de nada. Sonhas, por exemplo, que estás a convervar com o tio Juca. De repente, te lembras de que ele já morreu. E daí? A conversa continua.
Com toda a naturalidade.
Já imaginaste que bom se pudesses manter essa imperturbável serenidade na vida propriamente dita?”.
(Fragmentos de A vaca e o hipogrifo, de Mário Quintana)
(Imagem: americanas.com.br)

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